Respublica     Repertório Português de Ciência Política         Edição electrónica 2004


Teologia Civil

As nações porque se alimentam fundamentalmente de meta-política, porque são a teologia mítica que alimenta a teologia civil, podem, com efeito, sobreviver à s catástrofes políticas  que ,por vezes, abalam ou destróem as cidades, incluindo as próprias ocupações ou conquistas.

Em Hobbes é, como assinala Voeglin, uma teologia civil para substituir o direito natural.Um esforço de racionalização e de interesseirismo, porque os indivíduos através de um contrato entre eles, submetem-se a um terceiro, que não é parte do contrato,o governante, que passa a ter um poder total e absoluto.E entre os indivíduos e o Estado eis que já nada se interpõe.

Raymond Aron referia, por seu lado, as religiões seculares, as doutrinas que nas almas dos nossos contemporâneos ocupam o lugar da fé desaparecida, situando-se aqui em baixo, na lonjura do futuro, sob a forma de uma ordem social a criar, a salvação da humanidade.

Mas esta Europa que temos, esta união europeia  que vamos institucionalizando é marcada por uma ordem  que, como dizia Aron, não é a fundada na independência dos Estados nacionais, nem a da religião secular, com a sua igreja, a sua teologia, o intérprete - uma vez papa e outra imperador - dos profetas.Para o mesmo autor  a ordem que oferece o Ocidente não é nem imperial , nem totalitária, fundar-se-á sobre uma mistura de hegemonia do mais forte e de um consentimento real dos menos fortes.

Num tempo de guerras religiosas e que até permite transformar a soberania numa espécie de religião secular, servindo como aquela solução laica e racional-normativa, que tanto podia ser usada por católicos como por protestantes. Principalmente naquelas unidades políticas que têm de congregar-se em torno de algo que supere divergências confessionais e não pretendem a fragmentação do cujus regio, ejus religio.

Tanto o absolutismo como o estatismo exigem que uma só entidade ocupe a posição prévia da estadualidade, num crescendo que passa pela emergência de um princeps, transformado em imperator que, a partir de certa altura, se diz dominus e até deus, quando usurpa uma religião, pelo cesaropapismo, ou trata de criar o sucedâneo de uma religião secular.

 




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